segunda-feira, 27 de dezembro de 2010

365

Um ano tem trezentos e sessenta e cinco dias. Relativamente, parece muito tempo. E é. É tempo suficiente pra se mudar uma vida. Se fosse recapitular exatamente tudo que me ocorreu durante esses doze meses. Chegaria à conclusão de que amadureci uns cinco anos em quase trezentos e sessenta e tantos dias. E o ano ainda não acabou.

Não foram poucas as pessoas que passaram por aqui. Muitas delas passaram e me acenaram de longe. Outras entraram, sem bater e ficaram. Algumas me trouxeram presentes lindos, outras de grego. Algumas só me fizeram visitas, mas assim mesmo se fizeram marcantes, me trouxeram sorrisos e algumas lágrimas também. Pena umas terem ficado só pra um café e ido sem se despedir.

É incrível como a gente consegue gostar de graça de alguém, sentir necessidade da companhia, das conversas de ônibus, conversas de sofá [no Catalina] e de bar [no horto]. Dos sorrisos, das lágrimas, do ombro. E até daquele olhar como quem diz “Que porra foi essa que fizeste?”

Essas que foram entrando sem cerimônia, escancarando a porta e me roubando sorrisos e gargalhadas de doer a barriga, ainda estão aqui. Espero que estejam sempre. E quando elas lerem esse texto saberão exatamente o quanto são importantes pra mim. Que fique claro que eu as tranquei aqui dentro, oquei?! Joguei a chave pela janela. Sei que não posso obrigar ninguém a ficar. A chave tá ali, se alguém quiser sair até pode pegar. Mas beiber, me conhecendo bem, pra eu permitir que saiam vai ser foda.

Por quê? Porque elas deram voltas pelas minhas frustrações, angústias, medos. Me viram permitir meu ID aflorar e meu superego encher o saco no dia seguinte, sem que me julgassem. Ouviram meus lamentos, escutei os seus lamentos. Falamos de amores platônicos, de pai ausente, de madrastas loucas. De pais ciumentos, de sistema educacional de merda, de política, de Piaget, de gestalt-behaviorismo-psicanálise. De reggae. De rock in rio, de The Ments, Mutantes, Beatles, Interpol, Smiths, The Cure, Queens, Radiohead, A Perfect Circle, Raul, Sérgio Sampaio, Chico. De padrinhos e madrinhas dos filhos que terão. De coisas impossíveis, de amores e desamores do passado que insistem em se fazer presentes, de namoros “canoas”. Até promessas de fazer uma graduação juntos já rolou. De tanta coisa.

Se não fossem esses caras, seria difícil de arrancar sorriso do rosto que dois mil e dez me deu. Aprendi. Ensinei. Me apaixonei. Me fudi. Briguei, bati, apanhei. Errei pracaralho. Perdi esperanças e as achei flutuando nas conversas. Naquelas conversas. Nestas conversas.

É por tudo isso!

Amei e amo essas pessoas que entraram sem bater. E eu sei que eles, apesar de muitas outras rotações e translações, continuarão aqui, mesmo que não fisicamente. Mas estarão em meus pensamentos, idéias, opiniões. Por que amigo é sempre amigo.

Ah, e só pra não perder o costume de fim de ano: Feliz ano novo, galera leitora desse blogue.

sábado, 25 de dezembro de 2010

Em uma dessas sextas

É que as vozes das pessoas, o cheiro do cabelo e bordões usados apenas por elas, são coisas que conquistam a sua atenção, que o tomam pelo gosto, assim, logo de cara, sem nenhum esforço. E toda vez que conhece alguém, por mais que os olhos rodem por efeito do álcool na noite, sempre pára pra observar esses caracteres, aparentemente tão triviais, mas indispensáveis, principalmente em conjunto ali.

Quando tudo misturado em uma só pessoa o cara ouve até Lucy, com flores de celofane nas mãos, sussurrar dizendo que táxis feitos de papel de jornal estão à sua espera. Dá uma volta pela memória, acabando naquela nostalgia quase que cotidiana e bem enrolada em suas neuras pretéritas.

Foi ali: Aquele braço direito que segurava uma garrafa de cerveja. Aquele braço, com aquele relógio preto na pele branca. O sorriso dado de graça, junto às gargalhadas, aos amigos. Conversas em uma noite de sexta. Sorriso de dentes bonitos. Armação grossa dos óculos cobrindo aqueles olhos investigativos. O alargador preto na orelha branca, coberto pelo cabelo longo-ondulado de castanho bem claro, quase loiro. Era simplesmente quase perfeita sem nem conhecer esse cheiro castanho-doce do cabelo, nem voz, nem bordões que ela gostava de usar.

Ele andava meio cético, não acreditava em muita gente. Nem sentia muita gente já fazia algum tempo.

Andava nostálgico também, por um tempo que não volta. Um tempo misto de sujo e felicidade. Uma felicidade suja. Irreal, criada apenas em sua cabeça. Transpassada ao coração com uma esperança gritante, uma expectativa gigante de felicidade.

Andava cego. Cego de vontade de olhar ao redor, cego pelo medo de perceber a mesmice em que havia se afundado. E o pior: Por conta própria, enfiando um pé de cada vez lentamente de olhos conformados, semi-fechados. O fato é que aquela merda toda de interesses, refúgios, aos fins de semana, de angustias que se transvestiam, cada vez mais, em cotidianas, passou de adubo a concreto. Esqueceu de olhar ao redor.

Mas foi ali, naquela hora que soube da presença do diferente. Naquele momento tudo veio à tona, ao ver aquele corpo, aquela pele, cabelos longos, relógio preto, gestos atípicos, contrastes e reflexos de luzes. Olhar oculto que investiga por entre os óculos e seus dedos de unhas azuis que insistentemente ajeitam a lente rebelde e escorregadia pelo nariz de traços firmes. Copos cheios de refúgio alcoólico espremendo um sorriso de graça pelas graças de amigos.

Será que foi isso? Foi isso tudo e só? Que fez com que deixasse a cegueira de lado? Com que tornasse a nostalgia ainda mais forte? E deixado aquele ceticismo, que, aliás, não lhe cai tão bem assim, ir embora? Será? Ele até hoje sente o desejo de descobrir o que aconteceu naquela sexta daquele mês chato que, a seu ver, contraditoriamente, nada tem a oferecer.

Contraditoriamente. Fato. Naquele dia foi lhe oferecido a dúvida, a incerteza, a inquietante sensação da tristeza e felicidade anexadas ao mesmo sorriso. Excitações, obscenidades, inveja, ciúme, luxúria, de uma paixão [não correspondida].

Dezembro

Olhava fixamente através da janela semi coberta pela cortina. A cortina de espirais coloridos que ainda se encontrava ali, debatendo-se pelo vento, tão maleavelvemente. Cobriam a vista de Carolina esses espirais coloridos dançando fluorescentemente à sua frente ao som de Tiersen, enquanto seus pensamentos misturavam-se à chuva fina e fria de dezembro, ao piano triste de La dispute.

Seus pensamentos iam muito além de espirais dançantes, chuvas renitentes e longas fumaças tragadas. Seus pensamentos iam até lá, àquela época. A nostalgia era densa, bem mais que a fumaça. Tão presente que Carol chegou a pensar está revivendo aquela dor outra vez. Aquela dor que se fez muito necessária até. Pois sem ela jamais teria aprendido tudo. Conformado tudo. Sofrido tudo. Se rebelado contra tudo. Se libertado da mentira e aprendido.

Ela lembra. De olhos fechados, apertando as lágrimas calmas que escorriam sem serem enxutas da face pálida de frio, através dos óculos quebrados [naquela época]. O coração batia forte a cada vez que as notas da música iam fluindo, cada vez que o piano disparava. O filme vinha à mente.

Dezembro é quando, em sua memória, seus desejos ainda não realizados, suas saudades, suas dores, toda a merda de uma época vêm à tona tudo misturado. Sentimentos, sensações mistas às lágrimas que caíam ao som, à chuva, ao frio. À vontade de achar a tal felicidade que ainda não sabe se é verídica. Esperanças de fim de ano, de que as coisas mudem, de que tudo vá à merda, de que eles estejam sempre perto e que os outros vão embora. De que a música transpire sempre as sensações. De que suas vontades mais inconscientes, aquelas abraçadas com o ID, não a machuquem e nem a ninguém. Que seus medos não se concretizem e que ali mais à frente aperte a mão da invisível felicidade.